Na quarta-feira, dia 12, será realizado em Brasília um encontro para discutir o futuro do associativismo no Brasil. A Febramat participará do evento, ao lado de importantes nomes do empresariado e da política nacional. Na pauta, estão o debate sobre o Projeto de Lei Complementar nº 57/2021, que visa a regulamentar as centrais de negócios, e a celebração do Projeto Vamos!, realizado desde 2018 em parceria com a entidade alemã Der Mittelstandsverbund ZGV, que entra em sua reta final.
Na última entrevista da série especial sobre o Projeto Vamos!, o portal Febramat conversou com o Dr. Ludwig Veltmann, diretor-geral da Der Mittelstandsverbund ZGV. A associação atualmente representa os interesses de cerca de 230 mil empresas de médio porte, organizadas em cerca de trezentos grupos associativos, de cerca de 45 setores na Alemanha – suas associadas movimentam cerca de 18% do PIB do país. À frente dessa entidade há mais de vinte anos, Dr. Veltmann comenta sua trajetória profissional e os impactos positivos trazidos pelo associativismo ao segmento de matcon.
Para começar, conte um pouco de sua trajetória profissional e a relação com o associativismo empresarial no início de sua carreira.
Eu cresci em uma fazenda relativamente pequena, e todos os dias me perguntava se fazia sentido ter uma máquina separada para cada área de trabalho, além de se não faria mais sentido compartilhar o trabalho com os vizinhos, comprar máquinas juntos. Cresci com essa consciência e frequentemente implementávamos esses planos. Funcionou bem porque tornou o uso individual de máquinas muito mais lucrativo, com custos consideravelmente menores para o agricultor individual.
Mais tarde, fui para a universidade e lidei com o tema da cooperação como parte de meus estudos. Retomei o assunto na pós-graduação e realizei uma pesquisa em Taiwan para descobrir quais os fatores de sucesso da cooperação entre fazendas. Na época, Taiwan era uma ilha com uma população de 1,5 milhão de habitantes, cujo setor agrícola tinha escala muito pequena. O país era visto internacionalmente como um projeto modelo para ver e descobrir até que ponto a cooperação poderia ser usada. Concluí o trabalho, que mais tarde se tornou meu doutorado, com boas percepções sobre o tema.
Quando comecei minha carreira em organizações de agricultores, em 1988, segui observando o fenômeno da cooperação. Primeiro trabalhei na Associação de Agricultores Alemães, depois na Federação das Indústrias Alemãs e, em seguida, em projetos internacionais para várias outras associações. Além disso, iniciei e apoiei projetos para descobrir se a cooperação poderia ajudar a superar estruturas ultrapassadas em muitos países do mundo. Nesse meio tempo, estou envolvido na parceria com a Febramat há quase seis anos. O fato de as cooperativas alemãs terem sido bem-sucedidas na Alemanha por muitas décadas, quase séculos, pode ajudar a trazer esse sucesso para o Brasil.
Qual foi a motivação para criar essa parceria com o Brasil?
Tem muito a ver com a conexão com o professor Douglas Wegner, que concluiu parte de seus estudos de doutorado em Colônia e, mais tarde, constituímos uma amizade. Por meio dele, aprendi que o Brasil também está experimentando os conceitos da cooperação.
As cooperativas estão sendo experimentadas em muitas partes do País e são parcialmente subsidiadas com fundos estatais. Para mim, esse foi o ponto de partida para considerar se não faria sentido estabelecer uma parceria entre empresas brasileiras e alemãs. Em última análise, certamente é possível aprender muito uns com os outros em todos os continentes, especialmente quando se trata de cooperação entre empresas. Eu também sabia da existência de um programa do governo alemão para essas parcerias, que é financiado pelo Ministério Federal de Cooperação Econômica e Desenvolvimento. Então, estivemos no Brasil em 2018 como parte de uma missão de apuração de fatos e descobrimos que a Febramat é a principal associação de cooperação no setor de materiais de construção. Pudemos, assim, iniciar a parceria.
De que forma o modelo associativista se desenvolveu ao longo dos tempos?
Os pioneiros no assunto existiram em meados do século 19. Os que hoje associamos à ideia de cooperativa são Friedrich-Wilhelm Raiffeisen e Hermann Schulze Delitzsch, que criou cooperativas no setor comercial – as primeiras cooperativas de sapateiros, de carpinteiros e várias outras. E ele, de fato, deu o impulso para essa ideia, especialmente nos ofícios especializados.
O conceito foi desenvolvido ao longo das décadas. As questões originais de cooperação, como o poder de mercado em relação aos fornecedores ou à área de financiamento, agora incluem a área de marketing, de digitalização e, mais recentemente, de sustentabilidade. Como as empresas se posicionam de forma sustentável? Você não precisa apenas da disposição e do dinheiro, mas, acima de tudo, precisa também do conhecimento especializado sobre como fazer isso e, se uma pessoa não tiver esse conhecimento, é mais provável que ele seja encontrado em um grupo maior de empresas. Essa é a ideia de cooperação, que é o que gostamos de promover.
Quais o balanço que pode ser do Projeto Vamos!, que entra na reta final?
Do meu ponto de vista o projeto tem sido benéfico, especialmente o fato de ter sensibilizado a Febramat para a necessidade de se envolver com interesses políticos, organizar a defesa política de sua clientela. No início, havia uma falta de diálogo com políticos e tomadores de decisões – e não foi tão fácil iniciar isso no Brasil, mas a grande roda está girando.
De qualquer forma, a entidade já conseguiu fazer com que sua voz seja ouvida, o que é extremamente importante, porque só assim uma associação líder pode mudar a estrutura política em favor de seus membros. Mas essa não é a única questão sobre a qual eu digo que realmente conseguimos andar; tem ainda as estruturas organizacionais: estabelecer um sistema de qualificação, marketing, site. A comunicação profissional com os membros também foi muito bem-sucedida. E, sim, certamente estamos orgulhosos do fato de termos participado desse projeto.
Durante o projeto, a Der Mittelstandsverbund ZGV vivenciou o associativismo brasileiro. Como foi essa experiência?
Durante o período do projeto, a Febramat desenvolveu-se muito fortemente nas áreas de serviços e, em geral, construiu sua própria estrutura organizacional. Isso é ainda mais importante porque uma organização só é profissional se os funcionários trabalharem profissionalmente.
O que gostaria de deixar de legado ao associativismo, já que está deixando a diretoria-geral da entidade após mais de vinte anos?
De fato, não é tão simples sair depois de tanto tempo, quando você liderou uma organização como essa com um coração apaixonado e grande comprometimento. Principalmente porque, muitas vezes, você ainda tem a cabeça cheia de ideias e planos sobre como poderia continuar a apoiar de forma construtiva. Infelizmente, tive de aprender com a experiência que a burocracia é um problema: quando se consegue combater com sucesso uma regulamentação supérflua, duas ou três novas são criadas, especialmente na Europa. Mas isso são coisas com as quais temos de lidar como associação.
Por fim, existe futuro para as micro, pequenas e médias lojas fora do sistema associativista?
Não consigo imaginar que essas empresas sejam bem-sucedidas se não estiverem envolvidas em cooperações, se não utilizarem a força da comunidade e tentarem sobreviver como lutadores solitários. Você pode até ser um lutador solitário se tiver modelos de negócios muito exóticos; em um negócio comum, como o comércio de materiais de construção, dificilmente terá sucesso assim.
Você também precisa de experiência para se transformar rumo à digitalização e à sustentabilidade. Você precisa ainda de um aparato de qualificação, de ofertas e serviços que sejam bons, que não podem ser fornecidos por indivíduos. De acordo com o bom e velho ditado cooperativo alemão, “o que uma pessoa não pode fazer, muitos podem”. Você só pode sobreviver, só pode ter sucesso se tiver um espírito comunitário.